sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

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"Tire o seu sorriso do caminho, que eu quero passar com a minha dor." O trecho da música que lhe batia insistentemente na cabeça, e lhe irritava porque não poderia haver nada mais ordinário que aquela música naquele momento. Logo ela, que nem estava tão triste assim, e morava na capital. Apenas confusa ou, na verdade, muito perdida e sem saber pra onde ir agora. Parada na calçada enquanto guardava o cartão na carteira e esta na bolsa, pensava que sim, que estava bem. Amor tranquilo seria uma sorte imensa mesmo, não é? Quis tomar o caminho que sempre tomava e que lhe obrigava a passar na frente da casa do homem, mas se conteve. Por um momento quis olhar em sua cara e dizer que não queria mais nada mesmo, e que estava ótima, que voltaria a trabalhar logo e que não mais precisaria de relacionamentos destrutivos como o que eles tiveram. Mas ainda era tão cedo, preferiu respeitar o tempo. E também não havia nenhum emprego a caminho. Eu vou pra minha casa. Achava que ficar sozinha era o melhor, mas tinha certeza mesmo que queria era um colo. Mas aonde estaria? Lembrou que os dois se juntaram meio que por sobrevivência, por conveniência; ali, os dois, fracos e suscetíveis. Tirando o que precisavam um do outro; o bom dia, as ligações sem causa, o sexo, o corpo do outro que era um lar, a companhia e as brigas, as brigas que eram tão importantes. Como a gente brigava! E por tanta besteira... Mas dessa vez, a voz dele estava tão serena e seus olhos muito plácidos. Era de verdade, não era mais uma briga; entendeu. Com quem reclamaria da novela, agora? Quem seria capaz de ir buscá-la para almoçar às 17h da tarde? Quem iria suportar seu humor pela manhã? Quem seria capaz de permanecer em silêncio enquanto lia? Começou a sentir medo de ficar muito sozinha. Cigarro, nunca é demais; ainda mais agora. Comprou três maços na padaria que ficava à esquina da sua casa. Não pegou o troco. Em casa, trancou a porta em si e foi indo direto pro banho, largando as roupas no caminho (quem mais saberia viver naquela desordem?) mas lembrou de colocar o cd da ---- para tocar, bem alto, e os vizinhos? Ah, os vizinhos! Pago minhas contas ainda. Gritava embaixo da água e se contorcia nas paredes, derrubou o shampoo no corpo todo, com raiva. E fez muita espuma, espumava de ódio. Não sabia se de si, ou se do homem. Tinha nojo daquela situação toda, e tentava limpar-se um pouco. Por que não estou bem? Porque tenho que sentir essa agonia? Eu não quero, eu não quero, eu não quero, eu não quero; os olhos bem fechados. O amor teria se tornado angústia? Não havia chorado ainda. Tinha medo de se entregar, não queria entrar naquela esfera que estava lhe rodeando sorrateira, aquele ar embaçado, turvo de tristeza. Não se vestiu. Ainda de toalha desligou o som alto. Pensou em arrumar a casa, mas não. Já se sentia cansada, o sono batendo dentro dos olhos secos. Mas ainda pensava: o amor, teria se tornado angústia? O que faria com o amor na manhã seguinte? Por enquanto, estava jogado no cesto de roupas sujas. Mas transbordaria. Dormiu com uma névoa espessa dentro do seu quarto, a janela aberta. A luz logo entraria.

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